Em um divórcio, é comum imaginar que só entram na partilha os imóveis, os carros e os investimentos comuns. Mas e quando um dos cônjuges é sócio de uma empresa? A dúvida que atormenta muitos empresários é: a empresa entra ou não entra na divisão dos bens?

A resposta exige uma análise cuidadosa, porque nem toda empresa é igual — e nem todo crescimento patrimonial é comunicável.

O que diz a lei sobre isso?

Se o casamento foi celebrado sob o regime da comunhão parcial de bens, todos os bens adquiridos onerosamente durante a união são, em regra, comunicáveis. Isso inclui cotas de empresa adquiridas durante o casamento. Mas quando a empresa foi constituída antes do casamento, a discussão muda de rumo.

Segundo o artigo 1.659 do Código Civil, os bens adquiridos antes da união são particulares. Já o artigo 1.660, V, determina que os frutos civis dos bens particulares recebidos durante o casamento (como lucros e dividendos) podem entrar na partilha.

Mas e se a empresa crescer durante o casamento?

É aí que surge o debate mais delicado: a valorização da empresa na constância da união deve ser dividida com o outro cônjuge?

A jurisprudência brasileira não é unânime, mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem apontado caminhos mais objetivos.

Em decisão recente, o Ministro Herman Benjamin (AREsp 2.685.083, julgado em 04/09/2024), reconheceu que:

> “A valorização de cotas sociais, por si só, não gera meação, se decorreu de fatores econômicos e não do esforço comum do casal.”

Ou seja: só há partilha da valorização patrimonial se for comprovado que ela decorreu de esforço conjunto — o que nem sempre é fácil de demonstrar.

Outros tribunais, como o TJ-MG (Apelação Cível 5002636-11.2021.8.13.0637), também decidiram que, se a valorização ocorreu após a separação de fato, ou sem prova de participação do outro cônjuge, não há que se falar em partilha.

E quando o entendimento é diferente?

Por outro lado, o TJ-RS, em decisão de 2016 (AI 70068288364), afirmou que a valorização patrimonial de empresa ocorrida durante o casamento deve ser partilhada, mesmo que a empresa tenha sido aberta antes do casamento.

Esse conflito mostra que o juiz pode decidir de formas diferentes dependendo da prova apresentada, do contexto do casamento e da forma como o patrimônio foi administrado.

O que dizem os doutrinadores?

Rosa Maria de Andrade Nery e Nelson Nery Júnior explicam que, na comunhão parcial de bens, só se comunicam os bens adquiridos onerosamente durante a união — o que reforça que cotas antigas não entram automaticamente na partilha.

Fábio Coelho, ao tratar dos regimes de bens, lembra que os frutos civis (como lucros) podem ser partilháveis, mas não o próprio bem-fonte, se for anterior à união.

Como o empresário pode se proteger?

O ideal é atuar com prevenção, adotando algumas estratégias:

Ter contrato de casamento adequado ao seu perfil patrimonial;

Formalizar documentos societários com clareza, para distinguir o que é do sócio e o que é da empresa;

Registrar separações de fato;

E, sempre que possível, buscar assessoria jurídica para estruturar bem o patrimônio — especialmente antes de abrir uma empresa ou iniciar uma união.

Conclusão

A empresa não entra automaticamente na partilha. Mas sua valorização pode entrar, sim, se houver indícios de esforço comum ou se o juiz interpretar assim. Por isso, é fundamental que o empresário esteja bem informado — e bem assessorado.

Luciana Aparecida Camargo Galhardo

Advogada | OAB/SP 174.570

Especialista em Direito de Família, Sucessões, Empresarial e Patrimonial